Garabandal salvou minha vida sacerdotal

Soube de Garabandal em 1966, o que salvou a minha vida de sacerdócio. Perto do final do Concílio e nos primeiros anos que sucederam este acontecimento histórico, criou-se o letal "espírito do Vaticano II".

A carta do Concílio, a sua interpretação ortodoxa e genuína, foi tranquilamente posta em descanso. Poucos se deram ao trabalho de ler os documentos, a acta. Toda uma "Igreja nova", como foi chamada ingenuamente, foi conjurada por conferencistas e editores libertadores. Não só os rituais tradicionais e as formas de devoção foram declaradas abertas a uma mudança radical, mas os dogmas da fé e da moral foram rapidamente considerados alvos merecedores de revisão e desacordo.

Esta revolução foi vivenciada de forma mais atenta nos seminários e conventos. Eu era instrutor num seminário durante o período áureo desta nova era audaz. Segui o Concílio com avidez e fiquei exultante com os seus progressos e com aquilo que prometia, mas comecei a ficar seduzido pelo pseudo-espírito que pairava sobre todos nós.

Neste ponto crucial, em 1966, li uma notícia curta sobre as aparições em Garabandal. Pedi para me enviarem o primeiro relato de Sanchez-Ventura. Foi uma graça especial, um dom do reconhecimento de Nossa Senhora do Bom Conselho. Fui enviado para fora para desenvolver estudos superiores sobre as Escrituras. A necessidade de conhecimento tornou-se o mais urgente num tempo de agitação escolar e de desmistificação sistemática. Quando regressei com o meu doutoramento, o seminário encontrava-se perto da dissolução e fui nomeado para desenvolver trabalho pastoral. Ao longo de todos esses anos, mantive-me atentamente informado sobre os acontecimentos e as mensagens, "as palavras e feitos", de Garabandal. Um dia memorável foi a visita à minha paróquia de Joey Lomangino.

De encontro ao breve resumo que fiz sobre o contexto, gostaria de notar somente alguns dos muitos elementos de Garabandal que me suportaram e que, literalmente, me "salvaram" durante anos de dor espiritual e de sofrimento interior intensos.

Como referi, fiquei muitíssimo entusiasmado pelo anúncio e avanços do Vaticano II. Foi uma alegria inesperada que tal acontecimento histórico tivesse ocorrido nos meus primeiros tempos de sacerdócio. Se alguma designação pudesse ter-me sido dada, teria sido conotada com aquilo a que na altura se chamava a ala "liberal", ou "progressista". Quando tomei conhecimento, em 1966, do relato das aparições no norte de Espanha, fiquei convencido de que não fora uma mera coincidência os anos da "residência" de Maria em Garabandal terem coincidido com os do conselho ecuménico. A forma como devemos interpretar este facto não é fácil de presumir. Talvez Garabandal signifique um comentário do Céu à acta do Concílio, para dar aos crentes a chave do verdadeiro significado do Vaticano II e um antídoto para o "espírito" que rapidamente se propagara. Seja qual for o caso, tomei esta coincidência como um sinal para avaliar as ondas da mudança com o máximo cuidado.

Fátima e Garabandal

Fiquei também convencido de que a Mensagem de Garabandal foi uma declaração actualizada da Mensagem de Fátima, ao interpretar o que sucedeu anteriormente e o que acontecerá num futuro próximo. O facto destes acontecimentos terem tido lugar tão perto da data da revelação do "terceiro segredo" de Fátima e de terem passado com a consequente desilusão de muitos que, talvez confusos na sua curiosidade, esperavam ansiosamente por uma revelação pública, levou-me a estabelecer uma relação das duas aparições de Maria no nosso século.

Toda a atmosfera das aparições de Garabandal, bem como o resumo dos seus temas na Mensagem final parecem transportar o que muitos peritos crêem constituir grande parte do Segredo de Fátima, nomeadamente a crise dentro da Igreja, o grave ataque contra a Sagrada Eucaristia, o sacerdócio, o papado, a devoção a Maria e a apostasia que só poderia ter-se tornado possível através de uma hierarquia dividida. Em Fátima, Maria avisou que a Rússia espalharia os seus erros pelo mundo. Os erros da Rússia eram, por definição, um "materialismo dialéctico" ateu. Compreendi que, sem uma conquista política ou militar, a Igreja das nações ocidentais tinha sucumbido involuntariamente sem luta aos "erros" da Rússia.

O Cerne da Vida Cristã

A Mensagem final recapitula os grandes temas de Garabandal. A Sagrada Eucaristia, o Mistério da Fé, como epicentro da Mensagem de Maria. Tal como o Concílio tão magnificamente declarou, este Sacramento é a "fonte e o cerne" de toda a vida Cristã. Durante os dias e anos das suas aparições, Maria, directa e indirectamente, chamou a nossa atenção para a Presença Real do Seu filho. "Por que não visitais o meu Filho com mais frequência? Ele espera por vós dia e noite." A frequente recepção da Sagrada Comunhão por parte das meninas, através do ministério de um anjo, coroada pelo "milagrucu" da Hóstia visível, são tecidos no padrão como um fio místico. Um dos milhares de episódios espantosos tocou o meu coração: o do orgulho firme com que a Hóstia Sagrada foi levada a prisioneiros, pela Fé, durante as perseguições espanholas. Tanto as crianças como a multidão ficaram intrigadas quando Maria pediu para a beijar antes de todos os outros: "Ela pertence a meu filho". Que memória de reverência pelos cálice sagrado!

Enquanto a primeira Mensagem (18 de Outubro de 1961) nos instiga a "... visitar o Sagrado Sacramento com frequência...", a mensagem final (18 de Junho de 1965) transmite o veredicto dilacerante do Céu: "Cada vez menos importância tem sido dada à Eucaristia". Esta mensagem veio numa altura em que a diminuição da fé na Eucaristia tinha começado a instalar-se, em consequência de negligência, dúvida, negação, desprezo, abuso e sacrilégio. Durante séculos, a Igreja alimentou a existência de um cerco protector em torno do seu Tesouro mais precioso, a Eucaristia, inaestimabile donum , um tesouro sem preço. No entanto, nas últimas décadas caóticas, este cerco foi desmontado, peça a peça, até que agora as Espécies Sagradas estão expostas aos caprichos e pontos fracos de todos. A doutrina deste Mistério da Fé perdeu-se para grande parte da nossa geração. Resultados práticos: menos visitas, menos sinais de reverência, para não falar de adoração por aquilo que muitas vezes é apenas tratado como simples pão e vinho, símbolos ineficazes que têm mais a ver com temas laicos do que com realidades sagradas.

Aqui, a mensagem, em poucas palavras, resgatou a minha consciência. A perda da adoração pela Eucaristia tornou-se um sofrimento crescente e constante na minha vida de sacerdócio. É conferido o poder a todos os pastores para serem depositários da Eucaristia. Dei por mim envolvido num combate diário para proteger Nosso Senhor e manter os instintos de fé e de reverência do meu povo. Fui abençoado com pessoas profundamente devotas que me concederam uma grande consolação.

A Mensagem, por si só, parece ser negativa, mas tida como um veredicto do Céu confirmou a minha própria avaliação do que é talvez o aviso mais sério à vida católica.

Dignidade Sacerdotal

A Eucaristia nunca pode ser separada do sacerdócio. Esta é outro assunto principal de Garabandal - profunda preocupação pelos sacerdotes. Conchita comentou que Maria falava sobre os sacerdotes quase todos os dias. Enquanto muitos padres agonizavam numa "crise de identidade", numa aldeia remota o Céu proclamava, em palavras e actos, a grandiosidade e dignidade sacerdotais, a sua verdadeira identidade. Maria mostrou um amor maternal por todos os padres, porque são seus filhos, outros Cristos. Não exploro aqui aquilo que a maior parte dos leitores tão bem sabe. Irei somente mencionar o facto de que o Anjo distribuiu a Santa Comunhão às meninas só quando o pároco estava ausente da aldeia. Quando Conchita, incitada pelos observadores, perguntou como o Anjo obtinha Hóstias, uma vez que só os sacerdotes as podiam consagrar, o anjo confirmou que na verdade só eles as podiam consagrar. As Hóstias eram tiradas de tabernáculos terrenos. Maria repetiu às meninas a advertência tradicional: se encontrarem um padre e um anjo ao mesmo tempo, deverão reverenciar primeiro o padre.

Após estes factos, ouvimos as palavras chocantes da Mensagem final: "Muitos cardeais, muitos bispos e muitos padres encontram-se no caminho da perdição e levam muitas almas com eles". Pode compreender-se a relutância de Conchita em divulgar estas palavras. Não fora a própria Maria que ensinou as crianças a prestarem reverência aos padres? Houve alguma evasão piedosa temporária na intervenção de Conchita. A primeira versão só mencionou "muitos padres". Quando o bispo lhe perguntou se fora exactamente isto que o Arcanjo lhe dissera, ela acrescentou: "Muitos cardeais, muitos bispos...". Quando foi questionada por não os incluir a todos, Conchita perguntou: "Eles não são também padres?".

Dois Caminhos Divergentes

Como podemos conciliar o contraste? As palavras da Mensagem transmitem-nos a razão por que a sublimidade do sacerdócio precisa de ser enfatizada e "por que o crente tem que rezar fervorosamente pelos pastores das suas almas". Embora as palavras sejam tão indiciárias e pareçam tão negativas, foram-me especialmente úteis. Também eu tinha sentido a relutância de Conchita. Nos primeiros dias, esforcei-me para explicar a deriva de tantos padres irmãos relativamente a assuntos de doutrina e disciplina. Estaria eu, afinal, a julgar mal? Eis, depois, a amarga tomada de consciência: os padres encontravam-se agora divididos em dois grupos e caminhavam em sentidos divergentes. E, apesar das evidências acumuladas, foi somente alguns anos depois que acabei por aceitar toda a verdade. De facto, os cardeais e os bispos também eram padres e, tal como os padres, estavam divididos em dois caminhos: fidelidade ou afastamento.

Durante as aparições, Maria, Mãe da Igreja, sublinhou a autoridade suprema e unificadora do papado. Os dois caminhos de que falámos são, numa análise final, os da fidelidade ou afastamento em relação ao Papa. O Papa é a rocha, o portador da chave, o vigário, o pastor universal, e todos os dissidentes, mesmo os pastores mais importantes, estão "no caminho da perdição...". É esta deserção, responsável, sobretudo, pelo fenómeno da confusão, que Maria pressagiou que se intensificaria até à altura do Milagre. Quando os pastores são atingidos, o rebanho dispersa-se. A misteriosa "contagem final" sobre os papas recentes, que acabou com João Paulo II, assinalará el finale de los tiempos, literalmente "o fim dos tempos", interpretado de formas distintas. Esta profecia, no entanto, traz-nos a notícia consoladora de que a anarquia presente não durará. Haverá um tempo limite para o triunfo ilusório de Satanás.

Aviso-Milagre-Castigo

Como a crise se intensifica, torna-se cada vez mais evidente que os fundamentos das profecias têm que ser a solução. Quando nada na terra se pode aproveitar, então o céu intervirá. E, de todas as formas possíveis que a intervenção possa ter, a sequência do Aviso-Milagre-Castigo condicional parece espelhar melhor a misericórdia e a justiça de Deus. O Aviso, "a correcção da consciência do mundo", "uma antecipação no tempo do nosso julgamento final na eternidade", é, seguramente, o derradeiro apelo da misericórdia de Deus. Observei muitas vezes a relação destes acontecimentos com a revelação da Misericórdia Divina da Irmã Faustina.

O grande Milagre será uma efusão do amor curativo e da misericórdia purificadora do Coração de Jesus para com aqueles que reagiram ao Aviso. Será que a Cruz de Cristo, ao aparecer nos céus a iluminar a Terra, tal como previu a Irmã Faustina, está de algum modo relacionada com o Milagre?

A crise da Eucaristia, que mais tarde se veio a desenvolver, parece ter sido antecipada em Garabandal com a sua ênfase essencialmente na Eucaristia